2 Dezembro 2025

Do Minho a Massachusetts: Um Roteiro Gastronómico Entre a Tradição e a História

Reconhecida vulgarmente como a cidade dos Arcebispos, Braga ostenta também o título de uma das urbes mais felizes da Europa. Esta felicidade reflete-se, inevitavelmente, à mesa. Apoiada na edição de 2022 do guia Boa Cama Boa Mesa — disponível nas bancas e passível de aquisição direta —, a cidade convida a um périplo por espaços que celebram a boa comida. O guia, que conta com o apoio do BPI e do Recheio, serve de bússola para descobrir tesouros culinários onde a tradição se funde com a modernidade.

A Autenticidade Minhota e a Inovação Familiar

No restaurante Arcoense, a filosofia é clara: utilizam-se produtos da terra e de produção própria. O porco Bísaro é rei, chegando à mesa sob a forma de uns tradicionais “Rojões” ou no incontornável “Cozido à portuguesa”. Contudo, a missão de honrar a tradição não descura a frescura do mar, visível na “Cataplana de robalo com amêijoa” ou no “Polvo grelhado em molho verde”. Num ambiente que prima pelo conforto moderno, o serviço destaca-se pela simpatia e pelo aconselhamento exímio de vinhos, culminando a refeição com a doçura de uma “Barriga de freira”.

Já no Augusta, embora a decoração respire modernidade, a arte de bem servir tem raízes profundas na longa experiência familiar, oriunda do célebre restaurante Torres, em Vila Verde. O nome é uma homenagem à matriarca, guardiã dos sabores originais que, pontualmente, recebem toques de inovação pelas mãos dos filhos. O “Bacalhau à Augusta” e o “Lombo de boi com broa” são pratos de assinatura, sem esquecer a “Trouxa cremosa” para finalizar. Por sua vez, a Cozinha da Sé apresenta-se agora renovada no Chalé das Três Esquinas. Com uma ampla esplanada e interiores em tons de azul, serve clássicos regionais com uma apresentação contemporânea, onde se destacam os “Filetes de polvo” com arroz de grelos e a sua versão da Francesinha.

Das Carnes Maturadas ao Exotismo e à Cozinha Nipónica

Para os apreciadores de carne, o Kartilho é paragem obrigatória. Com uma garrafeira que ostenta mais de 300 referências nacionais, a casa aposta forte nas carnes maturadas DOP, expostas em arca própria logo à entrada. Antes de avançar para a picanha ou para a vazia, impõe-se a prova da tábua de enchidos e queijos. Numa vertente mais exótica, o espaço O Filho da Mãe propõe uma fusão entre a cozinha portuguesa e a sul-americana. Sob a batuta da chef Juliana Junqueira, provam-se “Patacones colombianos” e “Ceviches peruanos”, embora o menu também contemple a frescura de ostras e ouriços-do-mar.

A oferta diversifica-se ainda com o restaurante El Olivo, no Meliá Braga Hotel & Spa. Comandado pelo chef Elísio Bernardes, o espaço assume-se como uma referência de gastronomia tradicional com laivos de criatividade, onde o “Bacalhau à Braga” e o “Pudim Abade de Priscos” brilham num cenário onde a finalização dos pratos é visível ao cliente. Por fim, o Michizaki traz ao Minho o conceito de izakaya. Sendo um espaço de dimensões reduzidas, é gigante na confecão, servindo desde bento boxes ao almoço até especialidades como tonkotsu ramen, tudo preparado à vista dos clientes ao balcão.

Um Salto Transatlântico para a História Americana

Deixando para trás a efervescência culinária de Braga, atravessamos o Atlântico para encontrar um tipo diferente de tradição em Boston, Massachusetts. Se em Braga a inovação convive com o clássico, no Union Oyster House a história é o prato principal. Embora não seja o restaurante mais antigo do mundo — título que pertence a um mosteiro na Áustria —, esta casa reivindica o estatuto de restaurante em funcionamento contínuo mais antigo dos Estados Unidos, situado no histórico Freedom Trail.

O edifício, localizado na Union Street, é anterior à própria Guerra Civil e possui uma ligação intrínseca à fundação da América. Antes de se tornar um restaurante em 1826, sob o nome Atwood & Bacon, o espaço albergou um importador de tecidos e serviu de tipografia para o “The Massachusetts Spy”, o jornal mais antigo do país. A transformação em casa de pasto ocorreu numa época em que a indústria das ostras florescia no Nordeste americano, criando uma tendência que o estabelecimento soube capitalizar com mestria através do seu icónico bar semicircular.

Política, Ostras e o Legado de JFK

Ao longo dos séculos, figuras proeminentes da política americana tornaram-se clientes habituais. O Senador Daniel Webster era conhecido por consumir travessas de ostras acompanhadas de conhaque e água, enquanto John F. Kennedy tinha por hábito ler o jornal de domingo numa das mesas do restaurante — a cabine preferida do antigo Presidente está, aliás, devidamente assinalada no segundo piso. Apesar de Massachusetts ser fértil em restaurantes históricos, o Union Oyster House mantém-se como um marco inabalável, servindo marisco da mesma forma que o fazia há quase 200 anos.

Atualmente, a ementa continua a ser uma ode aos frutos do mar. A oferta é vasta e inclui desde o cocktail de camarão e rolos de lagosta recheados, até lulas, amêijoas e o clássico chowder da Nova Inglaterra. O peixe do dia é servido ao preço de mercado, garantindo a máxima frescura, e as ostras continuam a ser abertas na hora, à dúzia ou meia dúzia. Nas plataformas de avaliação como o TripAdvisor e o Yelp, os elogios sucedem-se, destacando a atmosfera rica em história que evita o pretensiosismo. Embora seja, indubitavelmente, um ponto de atração turística, o Union Oyster House consegue manter a qualidade gastronómica, provando que é possível servir história e sabor no mesmo prato.